A Inteligência Artificial (IA) é um desafio em diferentes dimensões da vida, no relacionamento pessoal e nos “atentados” informáticos às pessoas, gerando fotos e vozes confundíveis com as originais, é um fator de desenvolvimento tecnológico, médico, presente na produção musical, favorecendo os campos da indústria e da agricultura, do armamento e dos meios de comunicação. Refira-se que já noticiários cujo/a apresentador/a é um “boneco” artificial, mas facilmente passa por pessoa real.
Na autobiografia do Papa Francisco, Esperança, a IA é um dos assuntos refletidos na parte final. Francisco aponta os perigos, mas também os desafios e potencialidades da IA. A opção por se deixar escravizar pelos algoritmos ou se libertar pelo coração, pelo amor, pelo relacionamento presencial, pelo discernimento espiritual. Como outras “invenções”, também a IA poderá ser usada para o bem e para o mal. O Papa relembra como ele próprio foi “vítima” da IA, quando espalharam fotos suas a esquiar, por exemplo.
A internet (a rede), as redes sociais, os meios de comunicação social são instrumento, meio. “O tema central é ainda o da responsabilidade e da educação, e, se é verdade que os utensílios em si são neutros e que a faca que corta o pão é idêntica à que corta a garganta e que é só a mão que a empunha que determina a diferença, também é verdade que os meios mais difundidos e potentes necessitam ainda de consciência, ainda mais de atitude educativa e ainda mais de testemunho”.
Em relação à evolução tecnológica poderá haver duas posturas opostas, uma catastrofista, apocalíptica e outra a dos integrados, ingenuamente hiperotimista. Francisco dá um exemplo concreto, a discussão levantada no final do século XIX, se era aconselhável um padre andar ou não de bicicleta, havendo dioceses a proibir tal “prática”. Com efeito, diz-nos o Papa que “Deus doou aos homens o seu Espírito para que tenham ‘sageza, inteligência e ciência em todos os géneros de trabalho’ (Es 35, 31), e, assim, a ciência e a tecnologia são produtos extraordinários do potencial criativo de nós, seres humanos. Porém, devemos estar conscientes de que, tal como diz o antigo adágio inscrito no mito da espada de Dâmocles, de um grande poder derivam grandes responsabilidades… cabe ao homem decidir se deve tornar-se o alimento dos algoritmos ou… recuperar o seu centro mais íntimo: o coração”. Há de prevalecer a esperança, esperar que o vinho bom, o melhor vinho, ainda está para vir.
Na escolha do nome, que de algum modo faz parte do seu programa de vida, o novo Papa aponta esta nova revolução: “Justamente por me sentir chamado a seguir nessa linha, pensei em adotar o nome de Leão XIV. Na verdade, são várias as razões, mas a principal é porque o Papa Leão XIII, com a histórica Encíclica Rerum novarum, abordou a questão social no contexto da primeira grande revolução industrial; e, hoje, a Igreja oferece a todos a riqueza de sua doutrina social para responder a outra revolução industrial e aos desenvolvimentos da inteligência artificial, que trazem novos desafios para a defesa da dignidade humana, da justiça e do trabalho…”.
Acolhendo o legado do seu Predecessor, Leão XIV propõe “o regresso ao primado de Cristo no anúncio; a conversão missionária de toda a comunidade cristã; o crescimento na colegialidade e na sinodalidade; a atenção ao sensus fidei, especialmente nas suas formas mais próprias e inclusivas, como a piedade popular; o cuidado amoroso com os marginalizados e os excluídos; o diálogo corajoso e confiante com o mundo contemporâneo nas suas várias componentes e realidades”. Trata-se, enfim, de optar por Jesus Cristo e pela Sua postura de acolhimento, proximidade e serviço. Para quem chegou até aqui, deixo como sugestão de leitura, a Nota do Dicastério para a Doutrina da Fé e do Dicastério para a Cultura e Educação, dado à estampa a 28 de janeiro deste ano de 2025, “Antiqua et Nova. Nota sobre a relação entre a inteligência artificial e a inteligência humana”.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 95/40, n.º 4817, de 3 de setembro de 2025