Diz o poeta português, Fernando Pessoa, que “o valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso, existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis”.
O que se diz das coisas e, sobretudo, das pessoas, bem se pode dizer da vida, como dom e tarefa, como desafio e compromisso. Não chegámos cá por nossa iniciativa, por conseguinte, a vida é dom, foi-nos dada. Cabe-nos acolhê-la e vivê-la, senão tornar-se-á um peso, o dom seria um fardo ou um desperdício. Assim, a vida se torna uma tarefa que nos é confiada, está nas nossas mãos. Façamos com que se signifique bênção, comprometendo-nos, cada dia, a dar o melhor de nós, a potenciar os talentos que possuímos, a treinar-nos em tudo o que nos faça felizes e nos realize como pessoas.
Ouvimos amiúde dizer que a vida é longa, não pela quantidade dos anos, mas pela intensidade com que a vivemos. Não há um autor a citar, porque muitos o dizem e como cristãos bem sabemos que assim é. Jesus viveu entre nós, como ser humano, Deus-connosco, cerca de 37 anos. Se pensarmos que a esperança média de vida naquele tempo era bem mais baixa que na atualidade, talvez não tenha sido assim tão curta, mas não deixam de ser poucos anos de vida! Mas vejamos, em menos de três anos construiu um mundo novo, revolucionou a sociedade, a cultura, o mundo. Deixou uma marca indelével.
No tempo que passa, para alguns é um perfeito desconhecido, mesmo que os valores maiores das sociedades democráticas se devam à Sua mensagem de perdão, de compaixão, de solidariedade, ou valores como a igualdade, diante de Deus, que é Pai, e na mesma categoria humana, pois, n’Ele, somos irmãos. Nós tendemos ao divino, querendo-nos, muitos vezes, impor aos outros. Ele, que era Deus, quis ser um de nós, verdadeiramente humano, frágil e sujeito à nossa finitude, experimentando, connosco, o sofrimento, a desilusão, o desamor. Foi abandonado pelos amigos, traído pelos mais próximos, perseguido, difamado, julgado como malfeitor, condenado e morto. Ouvimo-l’O gritar e rezar uma dor extrema, vimo-lo transpirar gotículas de sangue, presenciámos a dureza dos açoites, que O deixaram quase irreconhecível, carregou o peso do mundo, no limite, a desfalecer, foi pregado numa cruz e morto. Esta é a herança de Jesus. Gastou-Se como um de nós, dando-Se, para que tenhamos vida em abundância, para aprendermos que podem matar-nos mas não pode tirar-nos a vida, acolhida e vivida.
Parafraseando Augusto Cury, Jesus precisou de três anos para oxigenar a mente de milhões de pessoas, desafiando-as a amar e a deixar-se amar, a gastar a vida, vivendo, dando o melhor, contribuindo para um mundo mais justo e fraterno, colocando prioridade na atenção e no cuidado aos últimos, aos mais pequenos, pobres e desfavorecidos, mulheres e crianças, publicanos e pecadores, estrangeiros e excluídos, e aos doentes. Podemos ter o mundo inteiro, mas se perdermos a vida, a alegria, o amor que nos liga uns aos outros, se perdermos a capacidade de agradecer e de louvar, então, em vez de dom e de bênção, a vida será vazio, treva e morte.
Nos momentos mais tenebrosos, Jesus não deixou de pensar nos outros – Pai perdoa-lhes porque não sabem o que fazem – nem deixou de confiar – Pai, nas Tuas mãos entrego a minha vida! Deixemo-nos inspirar por Ele, vivamos, agradeçamos, desfrutemos da vida, partilhando-a com os outros, apostemos na ternura, na compaixão e no perdão.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 93/10, n.º 4690, 25 de janeiro de 2023