Por estes dias, realizou-se um sonho de muitos jovens, de um incontável número de católicos, de um país a fazer-se, entre as encruzilhadas e avanços, a Jornada Mundial da Juventude, em Lisboa, que se concretizou em todo o país com as Pré Jornadas, com a oração e com a participação de milhares de jovens nas dioceses portuguesas.
O trabalho levou-nos aqui, a missão leva-nos a prosseguir o caminho, de anúncio do Evangelho, da alegria em promover a paz, da pressa em ajudar o outro. Haverá muito tempo para refletir o que correu bem e, para uma faixa significativa, também de cristãos católicos empenhados, o que correu menos bem ou correu mal. Há um copo que se enche e há um copo que está sempre perto de estar vazio. A ambição pelo melhor e a insatisfação, quando descontroladas, levam a depreciar as coisas belas da vida, os encontros, os sorrisos, a presença, as palavras de ânimo e de desafio, os gestos de carinho, atenção e gratidão. Participando nos últimos dias deste encontro mundial, testemunhei, como os demais, muitas situações e muitos momentos, de uma fé fervorosa (e paciente), mas também o cansaço, expresso muitas vezes no egoísmo, na irritação e, até diria, na dita má educação. Nas dificuldades, testa-se a fé, a identificação com Jesus Cristo. De facto, é mais fácil sermos Cristo quando as circunstâncias confluem para o bem e quando a vida nos é favorável. Nem sempre se visualiza facilidade no relacionamento com os outros, em momentos de sacrifício, contrariedade e, com ligeireza, levantamos muros, alimentamos discussões nas nossas certezas e na errância dos outros e, porque estávamos antes, temos prioridade! Mas sem esconder estas nossas dificuldades ou estes nossos feitios que se manifestam quando o calor, a fome e o cansaço apertam, estes foram dias de alegria, de gratidão, de fé e de festa.
Aqui e além, havia jovens a querer desistir do caminho já feito ou arrependidos dos primeiros passos percorridos, mas o encontro com o Papa Francisco, o Papa dos afetos, da proximidade, calou a murmuração e provocou a emoção, as lágrimas, a gratidão. Só por estes segundos de encontro próximo com o santo Padre, já valeu o esforço, o sacrifício, o suor e as lágrimas, pois novas lágrimas se sobrepuseram.
Muito se dirá dos gastos. Muitos, através da crítica fácil, conseguiram sucesso, visibilidade e foram amplamente beneficiados por este acontecimento que recolocou no centro do mundo e das notícias o nosso Portugal, à beira mar plantado!
Para mim, dois momentos iniciais foram profundamente marcantes, a proximidade física do Papa, inegável e que, por certo, será sublinhada por todos, e, por outro lado, a vigília da JMJ. No Campo da Graça (Parque Tejo), fez-se um silêncio inenarrável, durante a adoração do Santíssimo Sacramento, um milhão e meio de pessoas silenciou as vozes e, quando o Santíssimo foi exposto, como depois na bênção, milhares e milhares de crianças e jovens, e menos jovens, ajoelharam e o centro foi Jesus na hóstia consagrada. As motivações de cada um só Deus, apenas Deus, as sabe, mas este fica como um momento único de graça, de expressão de fé amadurecida ou a caminho, em busca ou redescoberta, ou na “imitação” de comportamentos e gestos. Quantas vezes, não queremos ouvir os conselhos, mas imitamos os gestos, as atitudes, pois também aí se anuncia a fé. Se não tivesse sido por mais nada, por este gesto de prosternação e adoração, de silêncio e contemplação, de gratidão e júbilo, já teria valido a pena participar na JMJ 2023.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, Ano 93/37, n.º 4717, de 16 de agosto de 2023