No dia 14 de maio de 2010, tive o privilégio, juntamente com alguns paroquianos, de estar fisicamente perto do Papa Bento XVI, no Porto, aquando da sua Viagem Apostólica a Portugal, como peregrino de Fátima. Segundo muitos, esta peregrinação foi um ponto de viragem no pontificado. Para aqueles que tiveram a oportunidade de se aproximar do Papa, de escutar as suas palavras, de ver os seus gestos e expressões, deu-se como que uma conversão entre a imagem vendida pela comunicação social e a constatação de um homem de Deus, simples, próximo, humilde e sábio.
No Porto, sublinhou que “tudo se define a partir de Cristo, quanto à origem e à eficácia da missão: a missão recebemo-la sempre de Cristo, que nos deu a conhecer o que ouviu a seu Pai, e somos nela investidos por meio do Espírito na Igreja. Como a própria Igreja, obra de Cristo e do seu Espírito, trata-se de renovar a face da terra a partir de Deus, sempre e só de Deus!”
As primeiras palavras, após a eleição, a 19 de abril de 2005, breves, são demasiado luminosas: “Depois do grande Papa João Paulo II, os Senhores Cardeais elegeram-me, simples e humilde trabalhador na vinha do Senhor. Consola-me saber que o Senhor sabe trabalhar e agir também com instrumentos insuficientes. E, sobretudo, recomendo-me às vossas orações. Na alegria do Senhor Ressuscitado, confiantes na sua ajuda permanente, vamos em frente. O Senhor ajudar-nos-á. Maria, sua Mãe Santíssima, está connosco”.
As pessoas que o conheciam como cardeal, testemunharam sempre a sua simplicidade, timidez e uma grande afabilidade para com cada pessoa, fosse quem fosse.
No início (oficial) do pontificado, a 24 de abril, reafirma-se ao serviço da palavra de Deus, confiando na intercessão dos santos e de todos os fiéis.
“E agora, neste momento, eu, frágil servo de Deus, devo assumir esta tarefa inaudita, que realmente supera qualquer capacidade humana. Como posso fazer isto? Como serei capaz de o fazer? Todos vós, queridos amigos, acabaste de invocar todos os santos, representados por alguns dos grandes nomes da história de Deus com os homens. Desta forma, também em mim se reaviva esta autoconsciência: não estou sozinho. Não devo carregar sozinho o que na realidade nunca poderia carregar sozinho. Os numerosos santos de Deus protegem-me, amparam-me e guiam-me. E a vossa oração, queridos amigos, a vossa indulgência, o vosso amor, a vossa fé e a vossa esperança acompanham-me. De facto, à comunidade dos santos não pertencem só as grandes figuras que nos precederam… Todos nós somos a comunidade dos santos, nós batizados em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, nós que vivemos do dom da carne e do sangue de Cristo, por meio do qual ele nos quer transformar e tornar-nos semelhantes a Si mesmo”.
Sobre um programa possível, afirma: “O meu verdadeiro programa de governo é não fazer a minha vontade, não perseguir ideias minhas, pondo-me, contudo, à escuta, com a Igreja inteira, da palavra e da vontade do Senhor e deixar-me guiar por Ele, de forma que seja Ele mesmo quem guia a Igreja nesta hora da nossa história”.
Nas conversas finais, com Peter Seewald…: “É preciso continuar a aprender o que a fé nos diz neste nosso tempo. É preciso aprender a ser mais humilde, mais simples, mais sofredor e a ter mais coragem para resistir; e, por outro lado, aprender a ser sincero e a estar disponível para continuar a caminhar”.
Pe. Manuel Goncalves, in Voz de Lamego, ano 93/07, n.º 4687, 4 de janeiro de 2023