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Nem tudo é o que parece

Somos altamente influenciáveis, direta ou indiretamente, positiva ou negativamente. Ser objetivo e imparcial numa determinada análise é um feito raro e heroico. Quem nunca verificou que se enganou numa primeira impressão relativamente a uma pessoa? Todos nós, variadíssimas vezes, em variadíssimos contextos.

Caracterizamos alguém pelo que tem vestido, pelo seu meio de transporte, pelo ambiente onde se encontra, pelos que o rodeiam. Criamos um historial daquela pessoa de forma tão detalhada quanto irracional em alguns segundos. Conhecer alguém requer tempo e diálogo, por vezes, nem numa vida conseguimos conhecer inteiramente um familiar ou amigo próximo. Conhecer verdadeiramente alguém implica assistir à sua reação perante diversas situações, mas também conhecer o seu pensamento profundo, o que nunca acontece com ninguém, já para não falar que nós próprios vamos mudando ao longo da nossa vida.

Ninguém consegue conhecer ninguém na sua verdadeira essência, e ainda bem! Todos temos aqueles pensamentos que apenas Deus conhece, precisamos de ter algo apenas nosso, precisamos de ter margem para melhorar e mostrar a nossa conquista.

Julgar alguém, seja pelo que for, é sempre mau. Criamos ideias que, inevitavelmente, estarão erradas e levarão a reações das quais nos iremos arrepender brevemente.

Se nos admiramos quando alguém que julgamos conhecer comete um crime, algo e alguém inimaginável, porque partimos da pior imagem perante alguém que apenas não está bem vestido? Gostaríamos que alguém nos maltratasse apenas porque nos acharam com mau aspeto da rua? Nada do que nos envolve caracteriza o que somos. As nossas atitudes é que devem dar a conhecer, mas é preciso que haja abertura a essa possibilidade.

A ilusão, está definida como: engano dos sentidos ou pensamento; o que se nos afigura ser o que não é; esperança irrealizável.

Quando um preso sai em liberdade tem as suas oportunidades barradas por ter um passado menos bom, o que não significa que atualmente seja uma má pessoa. Se virmos um preso na cadeia sentimos algum repúdio, mas se virmos o mesmo preso bem vestido, de blazer, fora do contexto da prisão, a imagem que chega é de um “senhor bem parecido”’”, no entanto, continua a ser um preso, apenas está fora do contexto!

Ao vermos um trabalhador que esteja por estes dias a vindimar, essa pessoa cansada, exausta, pode não ser um respeitado funcionário, mas o próprio dono da vinha.

Se numa festa de verão vemos um homem a beber uma cerveja e a divertir-se achamos banal, mas se ao tirar o casaco verificamos que tem uma ‘camisa de padre’, passa a ser alguém altamente criticado.

Nada é o que parece. Alguém bem visto na comunidade pode ser um monstro interiormente, um preso continua a ser uma pessoa que pode aprender com os erros, todos devem ser respeitados independentemente do seu emprego, assim como o tipo de emprego não deve retirar momentos de descontração e felicidade tão necessários à saúde mental.

Falsos julgamentos levam a que as pessoas deixem de viver como gostariam para viver em função do que outros acham “normal”’”, o que em nada melhora os seus níveis de felicidade.

O que mais criticamos nos outros é aquilo que também nós gostaríamos de fazer, mas temos receio das críticas, por isso tentamos que os outros não o façam para não nos sentirmos tão mal.

Inverter a tendência começa com a atitude de cada um de nós, não julgar e dar sempre o benefício da dúvida.


Raquel Assis, in Voz de Lamego, Ano 93/43, n.º 4723, de 27 de setembro de 2023

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