O pontificado do atual Papa faz sobressair a cultura do diálogo, do encontro, da inclusão e prevalece a atenção pobre, a misericórdia, a sinodalidade. A Igreja é mediadora da salvação, instrumento de graça: acolhe quem chega e quem procura, vai ao encontro de quem anda perdido, de quem é esquecido e maltratado; Igreja em saída, como o Bom Pastor, em busca das ovelhas perdidas, já não de uma, mas talvez noventa e nove. As periferias geográficas, mas sobretudo existenciais, um campo de missão. Como Maria, cabe-nos levantar e ir apressadamente para levar Jesus Cristo, a boa notícia da salvação, e a ajuda necessária.
Em que consiste a cultura do encontro? Diz-nos o santo Padre: “Uma cultura que pressupõe, como ponto central, que o outro tem muito para me dar. Que tenho de ir ao seu encontro numa atitude de abertura e escuta, sem preconceitos, isto é, sem pensar que pelo facto de ele ter ideias contrárias às minhas, ou ser ateu, não me pode trazer nada. Não é assim. Toda a pessoa pode dar-nos alguma coisa e toda a pessoa pode receber alguma coisa de nós. O preconceito é como um muro que impede que nos encontremos…”.
O tempo em que vivemos, apesar de tantas conquistas, da evolução tecnológica e científica, continua a gerar excluídos, a criar muros, a promover preconceitos, a acentuar diferenças, a sublinhar o que divide, a excluir o que não convém ou não está de acordo com a minha religião, o meu partido, o meu grupo.
São elucidativas as palavras do papa Francisco: “O mediador é aquele que, para unir as partes, paga do seu ordenado, paga com o que tem, consome-se a si próprio. O intermediário é um retalhista que faz descontos a ambas as partes para ter o seu merecido lucro. O amor coloca-nos no papel de mediadores e não de intermediários. O mediador sai sempre a perder, porque a lógica da caridade é chegar a perder tudo para que a unidade vença, para que o amor vença. Mas mais: a lei do cristão é a mesma do mediador. Para um cristão, progredir não é subir no emprego, ter uma boa reputação, ser considerado; para um cristão, progredir é «baixar-se» nesta tarefa de mediador” (Jorge Mario Bergoglio).
Na ordem mundial em que vivemos, amplamente assolada por conflitos, guerras, violência, assomam, cada vez mais, nacionalismos e extremismos, ora à esquerda ora à direita, ou na subjugação de interesses ambivalentes, para assumir ou manter o poder. O diálogo, por vezes, é artificial, mantém as aparências, perpetuando os interesses pessoais ou nacionais. Precisamos de mediadores, parafraseando o então Cardeal Bergoglio, agora Papa Francisco, que não estejam tanto à procura de benesses mas prontos a gastar-se para alcançar a paz, para erradicar a fome e a pobreza, para desenvolver os povos, para criar condições de igualdade e de liberdade para todos, de acesso a bens essenciais, educação e cultura, trabalho e habitação, saúde e segurança.
Precisamos de falar, para anunciarmos a prevalência da vida. Precisamos de escutar os outros e nos encontrarmos como irmãos. “O nosso Deus é um Deus próximo… próximo da nossa carne. O Deus do encontro que sai ao encontro do seu povo. O Deus que põe o seu povo em situação de encontro… Jesus ensina-nos outro caminho: sair. Sair a dar testemunho, sair a saber do irmão, sair a partilhar, sair a perguntar. Encarnar-se”.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 92/47, n.º 4677, 19 de outubro de 2022