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Em caminho até à porta de Deus

Todos os tempos litúrgicos têm o seu encanto, a sua importância, a sua profundidade espiritual. Contudo, a próxima semana, a semana maior, a Semana Santa, é a mais intensa e mais envolvente. Começa com o Domingo de Ramos na Paixão do Senhor, e ano após ano ouvimos a narração da entrada de Jesus em Jerusalém: “Juntamente com os seus discípulos e uma multidão crescente de peregrinos, Ele subira da planície da Galileia à Cidade Santa.”

Numa homilia de Bento XVI: “Em primeiro lugar diz que se trata de uma subida. Isto tem antes de tudo um significado muito concreto. Jericó, onde teve início a última parte da peregrinação de Jesus, encontra-se a 250 metros sob o nível do mar, enquanto que Jerusalém – a meta do caminho – está a 740-780 metros acima do nível do mar: uma subida de quase mil metros. Mas este caminho exterior é sobretudo uma imagem do movimento interior da existência, que se realiza no seguimento de Cristo: é uma subida à verdadeira altura do ser homens.”

As caminhadas são um processo difícil… começamos ágeis, com energia, mas vamos caminhando e vamos ficando cansados, com sede, com respiração mais ofegante. É quando falta menos que demoramos mais, que nos dói mais, que sofremos mais.

Na longa caminhada que é a nossa vida, acontece o mesmo… nascemos e começamos a crescer com uma força enorme, tudo nos é possível, temos uma esperança e uma garra com as quais ultrapassamos todas as pedras do caminho. Mas vamos perdendo velocidade e energia, ganhando cansaço e dor, o peso da nossa vida nas nossas costas, o peso dos pecados, daquilo que fizemos menos bem ou que poderíamos ter feito melhor, o vislumbre, nos últimos quilómetros, de tudo aquilo que poderia ter sido diferente, o desejo de chegar ao fim e aliviar, descansar, de ser perdoado, de estar do colo da Mãe e do Pai.

Noutra homilia de Bento XVI: “Na antiga liturgia do Domingo de Ramos o sacerdote, ao chegar diante da igreja, batia com força com a haste da cruz da procissão na porta ainda fechada, que após este bater se abria. Era uma bonita imagem para o mistério do próprio Jesus Cristo que, com o madeiro da cruz, com a força do seu amor que se doa, bateu do lado do mundo à porta de Deus; do lado de um mundo que não conseguia encontrar o acesso para Deus. Com a Cruz Jesus abriu de par em par a porta de Deus, a porta entre Deus e os homens. Agora ela está aberta. Mas também do outro lado o Senhor bate com a sua cruz: bate às portas do mundo, às portas dos nossos corações, que assim com frequência e em tão grande número estão fechadas para Deus. E fala-nos mais ou menos assim: se as provas que Deus na criação te dá da sua existência não conseguem fazer com que te abras a Ele; se a palavra da Escritura e a mensagem da Igreja te deixam indiferente então olha para mim, para o Deus que por ti se fez sofredor, que pessoalmente sofre contigo vê que eu sofro por amor a ti e abre-te a mim, teu Senhor e teu Deus.“

Que esta Semana Santa seja, para cada um de nós, um carregamento de energia para continuarmos a caminhada, para conseguirmos subir até ao nosso Pai com a porta escancarada do nosso coração, pois a sua está permanente aberta à nossa espera.


Raquel Assis, in Voz de Lamego, ano 95/21, n.º 4798, de 9 de abril 2025

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