É tema escolhido pelo Papa Francisco para o Dia Mundial do Doente, que ocorre a 11 de fevereiro, festa de Nossa Senhora de Lurdes. O santo Padre enquadra a sua mensagem no sínodo sobre a sinodalidade da Igreja. Por conseguinte, o tema é completado com uma certeza que também é desafio: “A compaixão como exercício sinodal de cura”.
A interpelação é do Bom Samaritano. O sacerdote e o levita, cumprindo a lei, passam perto de um homem vítima de violência extrema, e afastam-se para não se contaminarem com um cadáver e para não se meterem em confusões! Um samaritano, vendo o homem caído por terra, aproxima-se para ver se pode fazer alguma coisa. Debruça-se sobre ele, liga-lhe as feridas, coloca-o na sua montada, e confia-o a um estalajadeiro. Partindo, o samaritano assegura-se que o enfermo será bem tratado e garante que regressará.
«Trata bem dele!» (Lc 10, 35). O samaritano envolve-se, mas também desafia outros a envolver-se. Jesus, diz-nos o santo Padre, repete esta recomendação a “cada um de nós na exortação conclusiva: «Vai e faz tu também o mesmo»”.
Existem situações que, na atualidade, reavivam a parábola narrada por Jesus. “Há uma profunda conexão entre esta parábola de Jesus e as múltiplas formas em que é negada hoje a fraternidade. De modo particular, no facto de a pessoa espancada e roubada acabar abandonada na estrada, podemos ver representada a condição em que são deixados tantos irmãos e irmãs nossos na hora em que mais precisam de ajuda. Não é fácil distinguir os atentados à vida e à sua dignidade que provêm de causas naturais e, ao invés, aqueles que são provocados por injustiças e violências. Na realidade, o nível das desigualdades e a prevalência dos interesses de poucos já incidem de tal modo sobre cada ambiente humano que é difícil considerar «natural» qualquer experiência. Cada doença realiza-se numa «cultura» por entre as suas contradições”.
O Evangelho faz-nos ver que há opções que nos desviam do comprometimento com o sofrimento dos outros, mas também opções que nos solidarizam com quem sofre, nos movem na direção dos mais frágeis e nos fazem agir para curar, cuidar, servir. Muitos vezes, nos dias que vivemos, “não há espaço para a fragilidade. E assim o mal, quando irrompe e nos ataca, deixa-nos por terra atordoados. Então pode acontecer que os outros nos abandonem, ou nos pareça que devemos abandoná-los a fim de não nos sentirem um peso para eles. Começa assim a solidão, e envenena-nos a sensação amarga duma injustiça, devido à qual até o Céu parece fechar-se-nos”.
Na sua mensagem, o Papa convida toda a Igreja a confrontar-se com a parábola do Bom Samaritano e a aprender a agir do mesmo modo, englobando todos na solução e na cura da sociedade contemporânea. “É tão importante, relativamente também à doença, que toda a Igreja se confronte com o exemplo evangélico do bom samaritano, para se tornar um válido «hospital de campanha»: com efeito a sua missão, especialmente nas circunstâncias históricas que atravessamos, exprime-se na prestação de cuidados. Todos somos frágeis e vulneráveis; todos precisamos daquela atenção compassiva que sabe deter-se, aproximar-se, cuidar e levantar”.
A parábola desafia-nos à fraternidade. “O que começou por um encontro de indivíduo com indivíduo, pode alargar-se para um tratamento organizado”. Ajuda imediata, mas também compromisso estrutural para cuidar dos mais vulneráveis, não como um fardo, mas como um serviço fraterno.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 93/12, n.º 4692, 8 de fevereiro de 2023