Fruto do Jubileu da Misericórdia (2015-2016), o Papa Francisco instituiu o Dia Mundial dos Pobres, a celebrar no penúltimo Domingo do ano litúrgico, este ano a 13 de novembro. O papa a convoca a Igreja e o mundo a refletir sobre a economia que gera cada vez mais pobres e excluídos, que mata aos poucos e que vai globalizando a indiferença.
A evolução tecnológica e científica, a globalização, possibilitada pelos meios de comunicação social e pelo desenvolvimento das vias de comunicação terrestes, aéreas e marítimas, não acrescentou humanidade, não aprofundou a corresponsabilização, ao invés, multiplicou a ganância e a pobreza. Há um crescente número de emigrantes e, sobretudo, de refugiados. Percebe-se, para citar uma expressão querida ao Papa, a globalização da indiferença para com os milhares de pobres que vagueiam pelo mundo à procura de uma vida melhor. A miséria gera revolta. A revolta gera conflitos, guerra e esta gera mais pobreza.
A pandemia mostrou-nos dois lados distintos. Por um lado, a vida miserável de muitos países que só tardiamente tiveram acesso a ventiladores e a produtos de proteção individual. A mesma dificuldade no acesso às vacinas, aguardando pela generosidade ou pelas sobras de outros. Por outro lado, a onda de solidariedade gerada em comunidades, aldeias, vilas e cidades, para acudir a muitos, para atender aos mais isolados, para não deixar ninguém para trás. Uma marca de esperança para o presente e para o futuro, pois é possível usar os recursos para responder às pessoas e aos povos mais carenciados.
Também a guerra na Ucrânia, na invasão criminosa levada a cabo pela Rússia, melhor, pela liderança russa, mostrou o lado lunar da humanidade, a que se contrapôs o lado luminoso da solidariedade. A guerra acende ódios e multiplica a violência, destrói famílias e faz dispersar povos inteiros, gerando ódios que se perpetuam nas gerações vindouras. Uma família destroçada pela morte de um dos seus membros, além do luto e da desolação, terá muitas dificuldades em perdoar, para já não falar na quase impossibilidade de voltar a confiar nas pessoas e/ou no povo agressor. A guerra pode ter raízes no passado, mas entranha-se no futuro na relação entre famílias, povos e regiões; destrutura a economia, gera pobreza, conduz ao descalabro social. São destruídos campos e colheitas, são destruídas fábricas que levarão muito tempo a ser reerguidas. Enquanto isso, há pessoas a fugir, a perder-se, a morrer, a mendigar, a serem violentadas pelo medo e pela morte de familiares e amigos.
Porém, há um lado luminoso em tudo isto, a entreajuda internacional, mas sobretudo a ajuda espontânea e organizada aos ucranianos em fuga, e outros refugiados, acolhendo-os e criando condições para que tenham uma vida digna e segura, e levando bens aqueles que tiveram de ficaram.
É este o ambiente do VI Dia Mundial dos Pobres, com guerras em diversas frentes, e com uma economia que mata, mas também a luz que irradia nas pessoas e que através delas faz sorrir milhares de crianças e adultos.
O tema da mensagem do santo Padre para esta jornada inspira-se em São Paulo: «Jesus Cristo (…) fez-Se pobre por vós» (2 Cor 8, 9). Se Ele Se faz pobre para nos enriquecer, cabe-nos acolher a Sua pobreza, o Seu amor, agindo do mesmo modo em prol dos outros.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 93/01, n.º 4680, 9 de novembro de 2022