HomeLegislaçãoO que muda com as mais recentes alterações ao código do trabalho
Legislação

O que muda com as mais recentes alterações ao código do trabalho

O Código do Trabalho conta já com a sua 23.ª alteração desde 2009. Com várias propostas em cima da mesa desde 2020, estas alterações conheceram vários avanços e recuos, sendo finalmente aprovadas na Assembleia da República, na passada sexta-feira, dia 17 de fevereiro.  

O documento final, aprovado em Plenário da Assembleia da República, altera ou introduz mais de 150 novas normas da lei do trabalho, das quais, destacamos as que nos parecem poder ter mais relevância no dia a dia dos trabalhadores e das empresas:

Restrição dos limites para a contração temporária ou a termo: As novas normas para a celebração de contratos temporários ou a termo passam a prever que as empresas que cessem contrato de trabalho com o trabalhador, por motivo não imputável, não poderão voltar a contratar a termo, em regime temporário para o mesmo posto, nem para a mesma atividade profissional, sem que tenha volvido pelo menos um terço da duração do contrato de trabalho. Além do empregador, esta norma aplica-se, também, a todas as empresas do mesmo grupo.

Sempre que as empresas recorram a empresas não licenciadas de trabalho temporário, estas ficam obrigadas a integrarem nos quadros, o trabalhador cedido a título temporário.

Outra das novidades em matéria de contratos, e com o intuito de evitar a precaridade dos contratos laborais, prende-se com o cruzamento de dados entre a Segurança Social (SS), Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), Autoridade Tributária (AT) e Instituto dos Registos e Notariado. Esta nova norma permitirá evitar a precaridade dos contratos laborais e facilitar o reconhecimento da existência de um contrato de trabalho (por exemplo os dados tributários ajudam a identificar indícios de falsos recibos verdes) e o combate às desigualdades de género.

Diminuição do Período Experimental: tanto para os jovens à procura do primeiro emprego, como para os desempregados de longa duração, a proposta aprovada pressupõe que o atual período experimental de 180 dias possa ser reduzido ou mesmo excluído. Além disso, o empregador está obrigado a comunicar à Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) a denúncia do contrato de trabalho durante o período experimental, e para isso dispõe de 15 dias. Para períodos experimentais de 120 dias ou mais, o empregador é obrigado a comunicar ao trabalhador a denúncia de contrato com um aviso prévio de 30 dias.

Estagiários não podem ganhar menos que o salário mínimo: Atualmente a lei prevê que o subsídio de estágio extracurricular tem como limiar mínimo o Indexante de Apoios Sociais, ou seja, 480 euros em 2023. Com as novas alterações, os estágios profissionais extracurriculares não poderão auferir menos que o salário mínimo nacional, isto é, 760 euros em 2023. Os estagiários passam ainda a ter um enquadramento na segurança social equiparado a contrato de trabalho por conta de outrem.

 Passa a existir um novo tipo de contrato de trabalho com estudantes, que vigorará em período de férias escolares ou interrupção letiva, não sendo para isso exigida a redução à forma escrita do mesmo.

Criminalização do trabalho não declarado: Neste âmbito foram feitos dois aditamentos a dois diplomas legais: 1- A não declaração do trabalhador num prazo de seis meses subsequentes ao termo do prazo legalmente previsto, passa a ser considerada crime com pena de prisão até três anos (Regime Geral das Infrações Tributárias- RGIT); 2- Não declarando o início da atividade do trabalhador na Segurança Social, competirá ao empregador pagar as contribuições dos 12 meses anteriores (Código dos Regimes Contributivos para a Segurança Social).

Registo Semanal de trabalhadores da agricultura e construção civil: obrigatoriedade do empregador fazer o registo semanal dos trabalhadores de explorações agrícolas e de estaleiros da construção civil, onde laborem dez ou mais trabalhadores;

Autoridade para as condições do Trabalho (ACT) e Ministério impedem despedimentos ilegais: já tendo vigorado como regime excecional por altura da pandemia, esta norma entra definitivamente como normativo legal do Código do Trabalho. Averiguando a existência de ilicitude no despedimento de um trabalhador, o inspetor do trabalho (Estatuto da Inspeção-Geral do Trabalho), notifica o empregador para que regularize a situação junto do trabalhador; havendo oposição por parte do empregador, é feita uma comunicação junto do ministério Público, que por sua vez suspende o despedimento por meio de um procedimento cautelar.

Compensações por despedimento aumentam: nas situações de despedimento coletivo e por extinção do posto de trabalho, aumenta o valor das compensações calculadas em função de 14 dias de retribuição base e diuturnidades, por cada ano completo de trabalho (ao invés dos atuais 12 dias de retribuição base e diuturnidades). Pese, embora, esta regra não terá efeitos retroativos, vigorando apenas a partir da entrada em vigor da nova lei.

Trabalhadores não podem optar por abdicar de créditos por fim do contrato: numa situação de despedimento ou numa situação de término do contrato, os trabalhadores não podem abdicar dos créditos que lhes são devidos, nomeadamente, subsídio de férias e/ou natal e de formação e horas suplementares e que são irrenunciáveis por lei, exceto se o fizerem, por acordo, em tribunal.

Alterações nos Contratos de Teletrabalho: os Contratos de Teletrabalho deverão, obrigatoriamente, incluir uma cláusula onde conste um valor fixo mensal para despesas. No entanto este valor fixado pelo acréscimo das despesas com teletrabalho “é considerada, para efeitos fiscais, custo para o empregador e não constitui rendimento do trabalhador, até ao limite do valor definido por portaria dos membros do governo responsáveis pelas áreas dos assuntos fiscais e segurança social”.  O pagamento de despesas adicionais com teletrabalho fica, assim, isento de IRS e de Taxa Social Única até um montante máximo, tal como acontece já com o subsídio de alimentação, que tem uma cobertura diária de 5,20 euros, se for pago por transferência bancária, ou de 8,32 euros, se for pago em cartão de refeição.

Novas condições de acesso ao Teletrabalho de pais de filhos com deficiência ou doença crónica: atualmente os pais de crianças com idades até aos três anos, ou oito (teletrabalho realizado de forma partilhada por ambos os progenitores) que padeçam de uma doença crónica ou sejam portadores de uma deficiência, podem optar pelo regime do teletrabalho; com a entrada em vigor das novas alterações este prazo cai por terra e é feito um alargamento da possibilidade de teletrabalho, nas funções em que ele seja possível, para estes pais, independentemente da idade dos filhos. Os pais com filhos com doença oncológica, independentemente da idade, o acesso ao teletrabalho também ser-lhes-á permitido.

Maior proteção dos trabalhadores com recibos verdes: com o intuito de combater o recurso abusivo a recibos verdes, o novo normativo legal estabelece que será penalizado o recurso repetido dos empregadores a esta modalidade. Demonstrando-se a reincidência na contratação de falsos recibos verdes, ao empregador pode ser interdito o direito a apoios, subsídios, ou outro tipo de benefícios de natureza fiscal, ou contributiva. Podendo ainda, serem interditados durante um período dois anos, de participar em concursos públicos.

Alteração do tempo de licença por falecimento do cônjuge ou enteados: no caso de falecimento de cônjuge ou enteado a lei prevê atualmente um período de licença de cinco dias. Com as atuais alterações esta licença é alargada dos atuais cinco para vinte dias e diminui o período de faltas em caso de morte de genro ou nora de vinte para cinco dias.

Licença por Luto Gestacional: será feito um aditamento à Lei do Trabalho, prevendo a possibilidade de falta em caso de luto gestacional, atribuindo três dias consecutivos aos pais nesta situação.

Licença parental exclusiva do pai alargada: já tínhamos abordado esta alteração neste jornal, na sua edição de 4 de janeiro, fazendo, também, ela parte do pacote de alterações ao Código do Trabalho. A nova norma determina que “é obrigatório o gozo pelo pai de uma licença parental de 28 dias, seguidos ou interpolados, nos 42 dias seguintes ao nascimento da criança, cinco dos quais gozados de modo consecutivo imediatamente a seguir a este”. Gozados os 28 dias de licença, “o pai tem direito a sete dias de licença, seguidos ou interpolados (em vez dos atuais cinco dias úteis), desde que gozados em simultâneo com o gozo da licença parental inicial por parte da mãe”. A proposta estabelece ainda que “em caso de internamento hospitalar da criança durante o período após o parto”, a licença obrigatória do pai “suspende-se, a pedido do pai, pelo tempo de duração do internamento”.

Alargamento da dispensa devido a processos de adoção e acolhimento: acrescem às novas alterações, a dispensa do trabalho nos casos de processos de adoção e acolhimento familiar. Nestes casos terão direito a “dispensas de trabalho para realização de avaliação ou para cumprimento das obrigações e procedimentos previstos na lei para os respetivos processos” sem limite. No entanto mantém-se a obrigatoriedade de apresentação de justificação ao empregador. Os adotantes / acolhedores podem ainda “gozar até 30 dias da licença parental inicial no período de transição e acompanhamento”, tendo ainda direito a licenças para assistência ao filho.

Baixas de curta duração admitidas pelo SNS: passa a ser possível baixa de até três dias passados pelo serviço digital do Serviço Nacional de Saúde (SNS24), através de declarações do próprio utente. Porém, esta possibilidade só será consentida a duas baixas por ano. 

Direito a trabalho parcial para Cuidadores Informais: A alteração da legislação laboral prevê também que “os cuidadores informais passarão a ter direito a requerer o regime de trabalho a tempo parcial durante um período de quatro anos, horário flexível e a possibilidade de recusar trabalho suplementar (…) passam a beneficiar de uma licença não remunerada de cinco dias consecutivos por ano que tem, porém, de ser comunicada ao empregador com dez dias de antecedência”. Acrescem a estas normas a alteração do regime de faltas para os cuidadores informais, sendo previsto 15 dias de faltas por ano para assistência a membro do agregado familiar.

Presunção do contrato vincula trabalhadores às plataformas digitais: as novas alterações à lei laboral, previstas no art.º 12.º-A, vêm definir presunções da existência de contratos laborais no âmbito das plataformas digitais (ex. Uber). O art.º 12.º- A apresenta seis características que podem levar a que um tribunal determine quem deve ser considerado o patrão de um motorista ou estafeta, caso se verifique a ocorrência de, pelo menos, uma dessas seis características. Querendo contestar essas presunções, será sempre a plataforma que terá de demonstrar que não deve ser considerada o empregador.  

Além destas, muitas mais são as alterações à Lei Laboral, alterações essas, que serão analisadas no próximo artigo deste jornal. Até lá, a expectativa é que as normas possam entrar em vigor em Abril, mas tudo depende da data e promulgação pelo Presidente da República e da sua posterior publicação em Diário da República.


Solicitadora Patrícia Maravilha, in Voz de Lamego, ano 93/15, n.º 4695, 1 de março de 2023

Deixe um comentário