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A comunicação que humaniza

“I want to tell you about my feelings”. É um texto que já me tem servido de base para outras reflexões e, quase num impulso, senti a necessidade de vo-lo apresentar novamente. “Quero falar contigo sobre os meus sentimentos”. O texto foi-me dado a conhecer há quase uma vintena de anos, pela Dra. Helena Gil da Costa, que o traduziu e que ministrava a cadeira de “Técnicas de Comunicação”, na Faculdade de Teologia do Porto, no curso de habilitação pedagógica (HPC), aquando da profissionalização na disciplina de EMRC.

Feito este enquadramento, mergulhemos no texto de Mamoru Itoh, entretanto editado e publicado em português (“Quero falar-te dos meus sentimentos. Padrões Culturais Editora).

A comunicação é essencial para que a vida floresça, para que possamos conhecer-nos e ao mundo que nos rodeia. O nosso corpo é limite e fronteira, delimita o que nos separa dos outros, do meio ambiente, mas, igualmente, projeta-nos para os outros, permite-te comunicar com eles, a fronteira possibilita o encontro, respeitando a identidade do outro, o seu espaço, o seu corpo, o seu mundo. Podemos, neste propósito, ter duas ou três reações diferentes, considerando o outro como adversário que me limita, o que poderá, em alguns casos conduzir ao egoísmo, à prepotência e sobranceria, ou à atitude despótica de quem usa os outros ou os elimina para ganhar território; a indiferença, que se une à atitude anterior, e o outro como sujeito de encontro e diálogo que me enriquece com as suas especificidades, dons e talentos. Podemos enriquecer-nos mutuamente.

Falar sobre o tempo, sublinha o autor, não é comunicação propriamente dita. Comunicar sobre sentimentos, o que enforma a vida humana, isso sim, é comunicação. Mamoru usa com mestria esta imagem. O jogo começa, alguém tem de atirar a primeira bola. Talvez tenhas de ser tu a atirar a primeira bola. Existe o medo, de quem inica, que o outro não consiga ou não queira apanhar a bola. Se lanças a bola e ninguém a apanha, ficas triste! Não se pode lançar com demasiada força, nem com força a menos. Podemos lançar uma bola grande e o outro não ter como a apanhar. Ou lançamos uma bola grande e quando regressa já é demasiado pequena! Jogar é uma arte. Leva o seu tempo e as suas tentativas. Temos que aprender a lançar a bola e a recebê-la. Nem todas as bolas lançadas serão recebidas. É assim a vida. São assim os sentimentos.

“Se vós estiverdes demasiadamente perto, ou se estiverdes demasiadamente longe um do outro, não é fácil jogar à bola. Se vós estiverdes demasiadamente perto, ou demasiadamente longe, da pessoa a quem amais, ou do vosso amigo, ou do vosso filho, ou dos vossos pais, não é fácil comunicar. A comunicação não começa com as duas pessoas a falar ao mesmo tempo. De um lado ou do outro tem de partir o primeiro movimento”.

E o autor continua a clarificar a comunicação com esta metáfora. “Tu não és o único que foste surpreendentemente rejeitado, que já recebeu uma bola devolvida, que é infeliz. Talvez tu já tenhas dado também alguns pontapés na bola, e feito alguém infeliz, e nem saibas que o estás a fazer… Todos nós queremos que as pessoas percebam que nós existimos”.

Se atiras a bola do teu coração e a outra pessoa a apanha e se tu apanhas a bola do coração que a outra pessoa te atirou, então uma fase da comunicação foi preenchida. Se te sentes preenchido, a tua vida muda também nas outras dimensões, a tua relação com outras pessoas, com o trabalho, tudo muda.

Como cristãos, a primeira fase da comunicação preenchida há de ser o amor de Deus para connosco e em nós.


Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 93/24, n.º 4704, 3 de maio 2023

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