A expressão, bem popular, sugere um amontoado de ideias, convicções ou opções sem haver um fio condutor, algo que seja compreensível, verificável, com princípio, meio e fim, alguma proposta que possa ser compreendida e posta em prática. Literariamente podemos dar-lhe outra textura, uma manta de retalhos que assume, recolhe e promove identidades e diferenças, que conjuga e harmoniza vivências, formas de pensar, viver e realizar a transformação do mundo.
Vivemos, como em outros momentos da história, mas talvez com menos desculpas, tempos conturbados, perigosos, destrutivos, em grande escala. Quando pensamos na evolução da ciência, da tecnologia, com os avanços biomédicos, com a globalização, com a facilidade de mobilidade e com a democratização dos meios de comunicação social, com as plataformas digitais, que nos permitem, através de um ecrã, escrevendo ou ditando algumas palavras, viajar pelo mundo inteiro e estar simultaneamente em vários lugares. Mas, como sublinhava Bento XVI, os meios de comunicação tornou-nos vizinhos mas não irmãos. Ou, como secundarizaria o Papa Francisco, a globalização a que assistimos é também globalização da indiferença e, por conseguinte, há que levantar-nos do sofá, desligar o/s ecrã/s, e encontrar-nos uns com os outros, para sermos ajuda, para construirmos a paz, para sermos casa uns dos outros, para criarmos o mundo novo que Jesus instaurou, iniciou e nos deu a missão de o cumprir.
Em Lisboa, o santo Padre usou a imagem dos ladrilhos que formam as calçadas bem portuguesas, cuja beleza e harmonia sobressaem em muitas ruas e vielas. É possível conjugar cores e materiais, formas e tamanhos, sem perder a harmonia e valorizando o conjunto. Assim na Igreja e na sociedade. Atravessamos o Sínodo sobre a sinodalidade da Igreja. Uma Igreja que é chamada a fazer-se, em comunhão, a caminhar ao ritmo de Jesus Cristo, não deixando ninguém para trás, nem excluindo ninguém.
Noutra já popularizada expressão papal, vivemos a terceira guerra mundial aos pedaços. Guerrilhas, conflitos, ameaças, violência em tantas partes do mundo e que ultimamente explodem com particular violência na invasão da Ucrânia por parte de um país e sobretudo um ditador e pelo terrorismo perpetrado pelo Hamas a que se unem outros grupos igualmente terroristas a operar no médio oriente, no Irão, na Cisjordânia, no Iémen, sem esquecer Afeganistão, Cabo Delgado, em Moçambique… e muitos outros polos de guerra e de pobreza.
A paz é um sonho, que muitas vezes se transforma em promessa, e uma promessa que muitas vezes não passa de um sonho longínquo.
Entramos na Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos, com início a 18 de janeiro e o seu termo a 25 de janeiro, festa de conversão de são Paulo. O Apóstolo pregou a judeus e a gentios, procurando levar o Evangelho a todos os recantos do mundo conhecido à época, numa mensagem de amor e de paz, de justiça e verdade, levando Cristo, o Seu amor, e a todos envolvendo no mistério redentor, base da autêntica fraternidade.
Na caminhada do Advento proposta à diocese e vivida em algumas paróquias, na fidelidade ao lema escolhido pelo nosso Bispo, “Recolhei os pedaços que sobraram” (Jo 6, 12), uma dinâmica consistia em recolher pedaços de pano e, posteriormente, unir os pedaços numa manta. A manta, por sua vez, facilmente evoca a partilha do pão… antigamente, sob a manta era colocada a comida acessível a todos os que estivessem à volta, dentro de casa ou no campo e assim se partilhava o pão, o alimento e a vida. A manta de retalhos que as pessoas criaram, à sua maneira, uniram diferentes tipos de tecido e cores, num colorido que as tornou belas, com a dedicação e trabalho dos membros da comunidade. É esta harmonia, esta unidade que buscamos, respeitando as diferenças e utilizando-as para mutuamente crescermos, nos enriquecermos, amadurecendo. Há algumas regras básicas como o respeito, o diálogo, a regra de outro, fazer aos outros o que desejamos para nós. Para nós, cristãos, bastará amar como Jesus nos amou e, assim, saberemos ser filhos de Deus, irmãos uns dos outros e prosseguir em lógica de fraternidade.
Pe. Manuel Gonçalves, in Voz de Lamego, ano 94/10, n.º 4738, de 17 de janeiro de 2024.